02 abril 2015

TEXTOS CRÍTICOS DO MIELT - 03

Ensino como prática social: formação de professores e educação básica
Rita de Cássia Moreira da Silva


Uma formação docente como prática social pode ser um bom caminho para chegarmos à humanização da educação básica. Esperamos formar nossos alunos dos ensinos fundamentais (I e II) e médio para que se tornem agentes ativos na/da sociedade em que estão inseridos. Mas os próprios professores, por vezes, não são formados sob tal perspectiva.

Mesmo nas universidades é possível perceber que existe uma relação de poder preestabelecida entre acadêmicos e professores formadores que inibe aqueles que estão sendo formados, e os coloca em uma posição de acumuladores de conhecimentos e teorias transferidos por aqueles que estão formando. É importante, porém, não generalizar, pois a universidade possui também professores incrivelmente humanizados e preparados para o papel de formadores.

É preciso refletir, porém, que, se os alunos para os quais lecionamos hoje, na educação básica, são apenas reprodutores de conteúdos apresentados a eles em aulas expositivas, muito disso é reflexo do que tem sido feito nas salas de aula dos cursos superiores de licenciatura. É importante pensar o processo de formação docente não apenas como um processo de formação profissional, mas como uma prática social de humanização e capacitação para que aquele sujeito/indivíduo que está sendo formado esteja preparado não apenas para ministrar aulas e expor conhecimentos aplicados a conteúdos, mas para pensar criticamente seu papel na sociedade. Não aquele papel de responsável pelos problemas e pela busca de possíveis soluções, mas aquele papel de cidadão que reconhece e reflete sua importância na construção da sociedade.

Para que possamos apresentar aos nossos alunos essa ideia de que eles precisam aprender a pensar, refletir, questionar de forma crítica, precisamos aprender, antes disso, nós mesmos, enquanto professores, a pensar, refletir, e questionar de forma crítica. Nós também acabamos, em algum momento, nos tornando repetidores daquilo que nossos professores formadores com visões mais tradicionalistas de ensino acabam nos mostrando nas aulas da faculdade. Enquanto professores em formação, também precisamos questionar as temáticas, os conteúdos, os métodos, as metodologias. 

Refletindo a respeito dos papeis desenvolvidos pelo professor e pelo aluno, tanto no processo de formação docente como no processo de ensino-aprendizagem da educação básica, penso que esse processo pode ser esquematizado da seguinte forma:

Ensinar não é papel exclusivo do professor. Aprender não é papel exclusivo do aluno. Ensinar não é o ato do professor de transmitir conhecimento. Aprender não é o ato do aluno de receber e reproduzir o conhecimento transmitido. Se olharmos o processo de ensino-aprendizagem, - tanto aquele que envolve o professor formador e o professor em formação em condição de aluno, como o que envolve professor e aluno nas escolas de ensino básico -, como uma prática social, percebemos que aprender e ensinar são papeis que ambos podem assumir, visto que o que há nesse processo não é uma transmissão de conhecimentos, mas uma construção de conhecimentos.

É claro que o professor assumirá um papel de mediador, organizador no decorrer desta prática, pois os alunos não são, ainda, autônomos. O professor deve possibilitar formas de desenvolver a autonomia do aluno, deve orientar, apontar caminhos, incentivar. Para que isso seja possível, porém, é necessário que, acima de tudo, o professor tenha conhecimento de para quem e para quê ele está desenvolvendo essa prática pedagógica. Não é possível tentar desenvolver a autonomia de um aluno se não se conhece esse aluno, se não se sabe até que ponto ele é ou deixa de ser autônomo, construtor do próprio conhecimento. Por tal motivo, essa prática pedagógica como prática social exige flexibilidade e contextualização.

Flexibilidade porque o professor, enquanto mediador da construção de conhecimento, precisa perceber e compreender os efeitos que suas diversas estratégias de ensinagem têm sobre os seus alunos, para reforçá-las quando obtiverem sucesso, e modificá-las quando não derem bons resultados. Contextualização porque, para colocar em pauta uma prática pedagógica que se baseia na formação de cidadãos pensantes, reflexivos e críticos, essa prática precisa estar atrelada ao contexto social/real daqueles que estão sendo formados.


Docência do Ensino Superior: desconstruindo paradigmas

Thiffanne Pereira dos Santos


A sociedade atual vive em um contexto onde as exigências sobre a atuação de cada sujeito aumentam a cada dia. Para atender as demandas que emanam desse novo cenário, é necessário que se promova uma formação que estimule o desenvolvimento de diversos aspectos, inclusive o emocional. Para isso, é preciso desconstruir o paradigma tradicional veiculado à docência do ensino superior e buscar novas alternativas para aprimorar o processo de aquisição de saberes.

No paradigma tradicional, a preocupação está centrada na transmissão dos conteúdos pelo professor. Cabe a ele ensinar e explicar aos alunos, de forma clara e acessível, aqueles conteúdos que considera como essenciais para a formação deles. Esse professor, “ao tomar a simples transmissão da informação como ensino, [...] fica como fonte do saber, tornando-se no portador e na garantia da verdade” (PIMENTA; ANASTASIOU, 2005, p.207).

Assim, o professor é o detentor do saber e o aluno é visto como um “copo vazio” que precisa ser preenchido por meio da transmissão de novos conhecimentos. O aluno que consegue aprender todo o conteúdo transmitido e alcançar os resultados esperados é considerado apto para desempenhar seu papel na sociedade.

Desse modo, nesse paradigma, não há a problematização do que é ensinado. O sucesso do aluno é representado apenas por sua capacidade de decorar os conteúdos e depois reproduzi-los em testes e avaliações. Tal perspectiva de docência, já não é mais suficiente para atender às demandas da sociedade emergente que, por sua vez, exige dos sujeitos novas habilidades e competências.
Na sociedade emergente, os sujeitos precisam estar preparados para lidar com o incerto e com as situações inusitadas. Por isso, a formação oferecida aos alunos não pode estar focada apenas na transmissão de conteúdos. Precisa também estimular habilidades relacionadas à inteligência emocional. Diante dos problemas e incertezas impostas pelo cenário atual, cada aluno deve ser capaz de lidar com os problemas de forma consciente ao mesmo tempo em que reformula seus conhecimentos.

Dessa forma, a formação de cada sujeito vai sendo aprimorada à medida que ele cria novas formas de trabalhar, de se relacionar e de lidar com os problemas. Não há uma formação definitiva sempre há espaço para novas aprendizagens, “isso pressupõe um perfil de formação inacabado, um conceito de formação permanente, contínua, especializada, em ação” (ALARCÃO; TAVARES, 2001, p. 103).

A docência do ensino superior deve almejar a formação de sujeitos autônomos, reflexivos e capazes de questionar os conhecimentos que são apresentados a eles. Os alunos devem aprender a inquietar-se diante dos saberes que são considerados verdades absolutas. Para tal, é fundamental que se desenvolvam práticas que estimulem à construção do conhecimento e à autonomia dos alunos nesse processo.

Por fim, não há mais espaço para uma formação com vistas à mera transmissão de conteúdos do professor para o aluno. Ao contrário, emerge a busca por uma docência do ensino superior que incite a reflexão, a autonomia, o diálogo e a construção de habilidades que auxiliem na superação dos novos desafios impostos pela sociedade atual.

Professor: de “modelo e guia” à parceiro ativo e motivador

Luciana Ribeiro Alves Vieira


A questão da qualidade do ensino superior, com ênfase na formação de professores, está em voga, visto que há uma emergente necessidade de preparar professores e alunos para as novas realidades educacionais, levando em consideração que estamos vivendo em um mundo altamente tecnológico, rico em diversidade e em desigualdades.

Se estamos na era da comunicação, como não nos comunicar? Como não buscar novas aprendizagens, novos saberes e novas maneiras de construí-los e disseminá-los? Como não buscar novas estratégias para aperfeiçoar esse trabalho tão humanizador, realizado por sujeitos responsáveis pelo seu processo educacional?

Quando refiro-me à processo educacional, este vai muito além dos muros das escolas. Estou falando de vida, afinal, o processo é lento e contínuo. Todo ser humano aprende e ensina algo a alguém todos os dias de sua vida e nas mais variadas situações. Mas o professor tem um diferencial: fez deste processo a sua profissão. 

Esse professor, que durante um longo período da história humana foi tido como “mestre, modelo e guia”, vem assumindo um outro papel na sociedade. Um papel mais amplo, de verdadeiro profissional da formação humana. E para que esse novo papel, essa nova postura se estabeleça, de fato, muitos paradigmas devem ser rompidos e/ou “desformatados”. 

A ideia de professor como mestre, dá-nos a ideia de respeito, porém, a falsa superioridade que ela nos impõe, não é salutar. Outorgar ao professor o título de autoridade máxima do conhecimento implica reduzir o direito do aluno de apenas moldar-se de acordo com os padrões estabelecidos, produzindo alunos sem cor, sem voz... Meras sombras de seu condutor em busca da hegemonia de um grupo. 

Romper com esse paradigma tradicional exige muito além de boa vontade, pois para tal, é preciso superar abordagens que estão arraigadas na formação de todos nós, como alunos, professores... como gente. É preciso coragem, disposição e disciplina intelectual para criar, compreender, inventar e reinventar-se nesse processo de descoberta do mundo.

É difícil buscar a mudança enquanto tudo à sua volta conspira para o “fazer sempre igual”, e “sempre deu certo”, “é mais seguro assim”. Essas são falas rotineiras dos autores principais que escrevem todos os dias a história de (in) sucesso da escola. E eu faço parte desse grupo ainda tão despreparado para lidar com formação de gente, mas não me enquadro mais na condição de falsa autoridade do saber, onde a simples repetição é tida como ato de aprendizagem.

Buscar a formação continuada, refletindo no processo de construção do conhecimento, bem como no próprio processo de constituição enquanto professor é o primeiro passo para se preparar para ser um formador, um pesquisador investigador com novos conceitos do que vem a ser educação. Refletindo constantemente sobre a práxis é que podemos auxiliar diretamente os alunos a terem uma visão mais ampla desse mundo e descortiná-lo, reconstruí-lo.

A atual geração não se subordina aos mais velhos como antigamente e o respeito à hierarquia deve ser conquistado e não imposto como no paradigma tradicional. Para os jovens que não veem mais a educação como uma ascensão profissional, o futuro é hoje e precisam de motivação para buscar essa educação, os conhecimentos. Daí a necessidade de professores e alunos pensarem juntos, pesquisar, ouvir um ao outro, instigar e investigar; ir além, voltar e analisar o que já foi feito, dando continuidade às descobertas, às aprendizagens de fato construídas, valorizando as relações interpessoais, onde os sujeitos mais do que se completam... se “transbordam”.

Na sociedade da comunicação, é preciso uma formação mais humana, mais emocional, com mais espaços para o diálogo, confronto de ideias e troca de experiências... mais autonomia e responsabilidade para os sujeitos criarem, inovarem e divulgarem. 

É uma pena que não entendamos a amplitude do processo educacional enquanto estamos nos formando para sermos professores. Em minha graduação, senti em poucos professores essa “fome” por contaminar o outro com o espírito da busca (talvez estes também ainda não tivessem sido contaminados). E foram poucos os que tentaram romper em mim a ideia de professor “mestre”. Hoje vejo que minhas limitações intelectuais também podaram minhas construções nesse período e é por isso que tenho certeza que momentos de reflexão, de trocas, de análises grupais, poderiam e deveriam ser a base do currículo de cursos de formação de professores. Currículo este que deveria ser permeado pela emoção intelectual... uma emoção contagiante e emancipatória, preparando-nos para a busca de uma vida melhor.

Com a jornada já trilhada até aqui e após tantas experiências concretas vivenciadas com alunos de diferentes faixas etárias, já consigo me perguntar: o que eu faria de diferente? O que farei de melhor daqui pra frente? Já consigo me despojar do mestre modelo para tentar ser parceira ativa e motivadora? Estou caminhando...

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