29 abril 2013

Você pode escolher não ser professor.


Outro dia algumas pessoas me olharam torto depois de uma bela sugestão dada a um aluno de licenciatura do terceiro ano de um curso de minha cidade. Sim, ele havia postado em seu facebook o descontentamento em descobrir, em plena metade do curso de formação docente, que não era “isso que ele queria” para sua vida. Não perdi a oportunidade e lhe disse que ainda estava em tempo a desistência e a procura por outro curso do qual ele se agradasse mais. Percebi que não houve respostas de sua parte, tampouco “curtidas” em relação à minha postagem. Entendo bem o silenciamento dele e os discursos de outros comentadores que prosseguiram em aconselhá-lo para terminar o curso, mesmo que ele não se simpatizasse por aquela graduação. Refleti. Fiquei curioso para saber as motivações de algumas daquelas pessoas para estimular aquele licenciando a insistir na frustração de persistir em algo que ele próprio rejeita. Continuei a ler os comentários e houve um que me inculcou ainda mais: o produzido por uma recém-egressa de outro curso de licenciatura em que, de forma defensiva, construíra seus argumentos em favor do rapaz e com base em sua experiência efetivada no processo de formação docente. Disse em mau português: “[...] esse estágio é só teoria e enjoo (acredito que o complemento aqui é destinado aos professores orientadores de Estágio). Na prática não acontece nada do que os professores pedem e exigem para que seja feito”... Concordo em partes, mas isso é outro assunto. Concordo, mas não porque o texto agora é meu! Eu aconselhei o aluno a desistir do curso por um simples fato: não quero que aconteça no futuro, para o bem da qualidade de educação de nossos filhos, que ele venha exercer uma profissão pela qual ele não se simpatize. Porque nunca se sabe o que pode acontecer num mundo capitalista como este em que vivemos. Vai que, em um belo dia, ele acorde desempregado ou mesmo insatisfeito com sua outra profissão e, em busca de uma renda boa, resolva fazer um concurso público docente pensando na tranquilidade de uma carreira pública e estável. Sim, digo renda boa, porque, por mais que reforcemos que o professor não ganha bem, ele, ainda sim, ganha muito melhor do que muitos outros profissionais em nosso contexto. Inclusive conheço algumas dúzias de pessoas que abandonaram outra carreira para assumir a sala de aula. Todavia não sei se era por pura paixão pela arte docente, pelo desejo cidadão de mudança social ou pela garantia de um plano de saúde ou de uma futura aposentadoria. Afinal, vale tudo nesse mundo. E qual seria o valor do professor nesse mundo?! Talvez sendo triplicada a carga horária da profissão docente, em três turnos, some-se um bom valor. Talvez aliando a docência à outra profissão seja uma forma de se obter um bom orçamento. O curioso é que um futuro professor, outro dia, me disse (e eu registrei em pesquisa!) que ele pretende conciliar a docência com seu outro afazer para somar capital. Claro que essas são apenas ilustrações comuns. Contudo, gostaria de refletir até que ponto o professor pode ser um bom profissional pensando na docência como um modo de fazer “bico”? De outro ponto de vista, como o professor pode ser um bom profissional se hoje, em nosso contexto, ele é descartado pelo Estado no prazo de um ano sob um contrato em que se paga uma merreca? Compreendi que, desse jeito, não vale muito. Aliás, nem vale a pena! Não obstante, durante todos esses anos, na condição de formador de professores, sempre vejo cenas de comodismo e de descaso de alguns  professores que estão na escola apenas para cumprir seus últimos anos para se aposentar ou para pedir uma licença prêmio (olha o nome da recompensa!) etc. Nessa hora, tenho pena dos alunos em ter de suportar um professor desses em sala de aula. Se, como dizem as teorias, a identidade docente é também (des)construída ao longo da observação de aprendizagem (LORTIE, 2002), ou seja, o aluno, na condição de aprendiz, observa modelos sobre como “ser ou não ser professor” a partir da atuação que ele observa de seu mestre na profissão, imagine que concepção tal pupilo pode construir acerca do professor que está ministrando aula desmotivado, não gostando do que faz ou esperando apenas o dinheiro entrar em sua conta no fim do mês? Não esqueçamos que a profissão docente, diferentemente de muitas outras, é interativa. Não mexemos com papéis ou peças inanimadas, nossas relações sociais preveem o ser humano que, em todo momento, (re)age conforme nossas respostas e (atu)ações socioculturais e, por tabela, constitui-se e nos constitui via língua(gem). Daí, entendemos porque não devemos maldizer a nossa profissão em sala de aula. Entendemos os resultados de um estudo implementado em mais de 1500 escolas do país em que se observou que apenas 2% de alunos de ensino médio desejam ser professores. Ou seria muito ingênuo perceber que, pelo menos, parte das equivocadas concepções, ou melhor, parte do estado ruim generalizado pelo imaginário social atual acerca da carreira profissional do professor não contém resquícios representativos dessas condições e significações produzidas? Seja isso pelo que se faz ou pelo que se fala. Tenho trabalhado com dados que me levam a crer que muitos professores em formação não querem ser professores, mas caso haja um concurso público para a área, com toda certeza, todos os pesquisados fariam. Daí, questiono o que essa atitude pode produzir em termos de qualidade educacional, de construção do imaginário social da profissão, de proposta emancipadora aos nossos alunos. Desculpem-me, mas, entremeio às ações desses tipos de professores (aqueles que querem formar o seu pé-de-meia e não o aluno) quase só vejo elementos capitalistas neoliberais previstos em uma sociedade mercadológica, por sua vez, preocupada com contas e números. E isso não é um tipo de valor que minha profissão me permite acreditar que seja o ponto fundamental. Mais ainda: não é uma perspectiva que construo com meus alunos, futuros professores em formação inicial. Para mim, nesse caso, vale o consenso de que a qualidade nunca poderá ser medida em termos de quantidade.

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